Ovar: O que fazer em Ovar (um regresso às ruas da minha adolescência)
27/07/2020Ovar faz parte de mim. Tenho família na cidade, passei incontáveis verões em casa de primos e avós enquanto criança e adolescente.
Pedalei de bicicleta pelos trilhos da Ria de Aveiro. Calcorreei todos os pinhais da região. Mergulhei nas águas da deserta praia do Torrão do Lameiro. Empanturrei-me com deliciosas roscas de canela, frescas ou torradas. Comi caldeirada de peixe na então tasca Pinovai, pisando a areia do chão a poucos metros da praia do Furadouro. Chapinhei nas águas quentes do Areinho. Brinquei ao Carnaval de quando em vez. E até saí esporadicamente à noite na discoteca Pildrinha.
Mas, aos poucos, fui-me afastando da cidade. E o tempo passou…
Na verdade, raramente encarei Ovar como um destino turístico. É, para mim, local de família, espaço de memórias e emoções. Até porque, localizada entre as cidades de Aveiro e Porto, Ovar passa muitas vezes despercebida ao olhar do viajante. Decidi, pois, colocar um ponto final em tamanha injustiça, e fiz-me ao caminho para redescobrir as belezas do território vareiro.
Assim, planeei um roteiro em Ovar, com passagem por Esmoriz e Cortegaça, pensando o que fazer em Ovar na ótica do viajante – e não de quem tem ligações afetivas à cidade. Incluí museus e igrejas, passeios de bicicleta e stand up paddle, tanoarias e azulejos… e boa comida. É de tudo isso que este artigo trata: o melhor de Ovar, segundo os meus olhos, resumido em 17 locais a visitar e atividades que pode – e deve! – experimentar.
Eis, pois, muitas sugestões sobre o que fazer em Ovar, num roteiro pensado para três dias de estadia. Vamos a isso!
Ovar: o que ver, fazer e provar em 3 dias de viagem
Igreja de Válega
Acredito que a excêntrica Igreja de Válega não agrade a todos os cristãos, habituados a espaços mais cinzentos e austeros. Para mim, no entanto, não crente mas apreciador da criatividade humana, achei-a uma igreja fascinante.
Trata-se de um templo de uma só nave, com a frontaria voltada a poente e onde se inclui um nicho dedicado a Nossa Senhora do Amparo, padroeira de Válega. É precisamente pela frontaria que começa o deslumbramento, com o olhar embasbacado pelos vibrantes painéis de azulejos figurativos oriundos da Fábrica Aleluia, de Aveiro.
No interior, com as paredes também revestidas com painéis de azulejos, vitrais com representações da vida de Maria, e uma capela-mor com vitrais representando cenas da liturgia católica protagonizadas por quatro sacerdotes de Válega, a surpresa ganha ainda maior dimensão.
É, a todos os títulos, uma igreja surpreendente (e fundamental em qualquer roteiro em Ovar).
Museu Escolar Oliveira Lopes
As Escolas Primárias Oliveira Lopes foram uma das maiores referências educativas do concelho de Ovar, numa época em que a taxa de analfabetismo atingia cerca de 75% da população.
No caso de Válega, corria o ano de 1908 quando os irmãos Oliveira Lopes solicitaram autorização à Junta de Freguesia para edificarem uma escola, que seria posteriormente doada ao Estado. E assim, a 2 de outubro de 1910, dias antes da Implantação da República Portuguesa, era inaugurada a escola agora transformada em museu. Havia uma ala destinada à escola masculina; outra para a escola feminina; e uma terceira destinada à habitação dos dois professores.
Hoje em dia, o Museu Escolar Oliveira Lopes tem como missão auto-proposta “a salvaguarda e divulgação do legado das Escolas Primárias Oliveira Lopes e dos seus beneméritos, bem como a investigação e o estudo da evolução histórica do sistema educativo em Portugal”.
Na escola feita museu, encontram-se carteiras escolares, escrivaninhas, armários e expositores; um quadro de lousa rotativo; ábacos e caixas métricas; e fantásticos posters educativos colocados nas paredes da sala (vistos com o olhar de hoje, é difícil acreditar na complexidade dos currículos educativos de então!) . Trata-se, pois, de uma viagem no tempo – uma visita emocional aos tempos da escola primária de antigamente. Acredito que os mais velhos se emocionarão ao percorrer o museu!
Museu Etnográfico de Válega
Completando o triângulo de espaços cuja visita recomendo em Válega, o Museu Etnográfico (instalado na Casa do Povo) foi uma das melhores surpresas que tive durante a minha visita a Ovar.
Duvido que “etnográfico” seja a denominação mais acertada, mas isso pouco importa. O museu em si é um espaço que inclui uma cozinha com lareira e potes de ferro, mesas antigas de madeira e armários recheados de peças de cozinha de cerâmica e memórias das artes latoeiras. A alma do Museu Etnográfico, no entanto, é outra. Ou melhor, outras. Chamam-se Graça Alves e Teresa Amaral, e são elas que tornam o espaço verdadeiramente acolhedor.
Um local feito com amor. E isso tanto emana das palavras das suas responsáveis como se nota em todos os detalhes.
Para incluir na lista com o que fazer em Ovar! Ou melhor, e não menos importante, o que provar em Ovar (veja abaixo).
Mercado Municipal de Ovar
Inaugurado em 1955 e da autoria do arquiteto Januário Godinho, o Mercado de Ovar constitui uma das referências da arquitetura pública da cidade.
Num estudo intitulado Arquitetura religiosa de Januário Godinho em Ovar e Válega, de Sofia Nunes Vechina, o Mercado de Ovar é referido como sendo “inovador pela proposta de um espaço aberto onde se distribuem com aparente liberdade diversos pavilhões”, ao mesmo tempo que se enaltece o “respeito pela tradição”, aproximando o espaço ao “conceito de feira”.
Foi exatamente essa dicotomia feira – mercado que me ocorreu enquanto visitava o Mercado Municipal de Ovar. Ao deambular pelas bancas de fruta, legumes e peixe fresco parecia estar de facto num mercado; ao passo que a zona exterior em tudo me lembrava uma feira.
Rótulos à parte, e sendo eu amante de mercados como espaços de compreensão de culturas e tradições, não poderia deixar de passar por lá. E recomendar!
Casa-Museu Júlio Dinis
Pequena mas bem cuidada, a Casa-Museu Júlio Dinis serve para perceber como uma curtíssima passagem de Joaquim Guilherme Gomes Coelho por Ovar teve tamanha influência na sua (curta) obra literária. Foram apenas quatro meses, passados na casa da sua tia paterna, mas que viriam a ser decisivos na recolha de matéria-prima valiosa para os seus escritos.
Foi em Ovar que o escritor Júlio Dinis (pseudónimo usado por Joaquim), oriundo de uma família burguesa, tomou contacto com uma sociedade rural que procurou conhecer, através da observação minuciosa e da escuta de conversas. Consta, por exemplo, que Júlio Dinis passava muito tempo na sala de casa, sentado na escrivaninha, com as portadas entreabertas mas sem que se visse de fora para dentro, a observar e ouvir – e anotar – as conversas da rua. E retirou também muita informação preciosa das conversas tidas com a sua tia.
Todo esse material foi usado para descrever a sociedade rural da época, com grande detalhe e mestria, em dois dos seus mais prestigiados livros: As Pupilas do Senhor Reitor e A Morgadinha dos Canaviais.
A visitar!
“Rua do Azulejo”
A cidade de Ovar gosta de ser apelidada de Museu Vivo do Azulejo, fruto da quantidade e diversidade de fachadas azulejadas com origem nos séculos XIX e XX, ainda hoje existentes. É muito fácil, aliás, encontrar grande variedade de azulejos, muitos deles em bom estado de conservação, que conferem identidade ao perímetro urbano de Ovar. Como viajante, interesso-me por estes aspetos identitários dos locais que visito – e é aqui que entra a chamada Rua do Azulejo.
Nas palavras oficiais, a Rua do Azulejo é um projeto que, “através da criação de tapetes azulejares, reinterpreta o azulejo tradicional de forma lúdica e contemporânea, criando um percurso pelas principais fachadas azulejares do centro” de Ovar.
Na verdade, a Rua do Azulejo não é, de facto, uma rua. É um conceito, uma marca turística que se traduz numa pequena rota pedestre no centro de Ovar que permite apreciar alguns dos mais belos painéis de azulejos da cidade.
Capela do Passo de Verónica (e os outros seis “passos”)
Crê-se que a Irmandade dos Passos de Nosso Senhor Jesus Cristo tenha sido oficialmente fundada por volta de 1572. Não dispondo de capela própria, a Irmandade tinha sede na Igreja Matriz de Ovar. Reza também a história que, “por ocasião das grandes solenidades”, se erguiam pequenos templos com imagens de roca representando a Paixão de Cristo ao longo da Rua da Amargura. E que só no século XVIII, surgiu o primeiro Passo de pedra e cal, representando a Última Ceia, a Oração de Cristo no Horto e o Pretório.
Para mim, mesmo não sendo especial amante de arte sacra e tendo apenas conhecido duas das sete capelas – a da Igreja Matriz e a Capela do Passo de Verónica -, creio serem estas capelas um dos tesouros mais fascinantes que descobri em Ovar.
É uma pena não estarem todas disponíveis para visita, nem que fossem visitas guiadas coordenadas pelo Turismo local. Fica a sugestão para as autoridades competentes.
Igreja Matriz de Ovar
Localizada em frente ao Mercado Municipal, a Igreja Paroquial São Cristóvão de Ovar, também conhecida como Igreja Matriz de Ovar, é o templo cristão mais importante da cidade. O edifício é formado por nave e capela-mor com duas torres sineiras nas laterais e, como seria de esperar, totalmente revestido a azulejos.
No interior, encontra-se a Capela dos Passos, datada do último quartel do século XVIII e totalmente revestida a talha dourada. É uma das tais sete Capelas dos Passos existentes na malha urbana de Ovar.
Stand Up Paddle na Ria de Aveiro
Fazer Stand Up Paddle (SUP) nas águas calmas da Ria de Aveiro é, muito provavelmente, a melhor e mais surpreendente sugestão deste artigo. Para mim, foi o epílogo de um dia dedicado à Ria de Aveiro – entre passeios de bicicleta e visitas aos cais da ria -, e um dos melhores momentos que passei em Ovar.
Na verdade, tive sorte. O céu estava praticamente limpo, a temperatura amena, o pôr do sol belíssimo e… era noite de lua cheia. Tudo somado, foi uma experiência inacreditavelmente bela (e dura para os braços – mas isso é outra história), que recomendo sem reservas.
Foi lindo, lindo!