Esposende: Praias: da Apúlia a Esposende
03/08/2020Apetece o Verão em praias bonitas, onde as dunas altas pedem passeios de fim de tarde. Para uma Primavera ou um Outono tranquilos, recomenda-se a corda litoral entre a Apúlia e Esposende.
Apúlia, dos moinhos aos cavalos
A imagem que retemos das praias da Apúlia não é o areal branco e limpo, nem o mar frio e caprichoso; é aquela curiosa fila de moinhos instalados no cimo das dunas para aproveitar os ventos fortes da zona. Moeram milho ainda durante o século passado, e agora, recuperados pelos proprietários, são excelentes poisos de Verão num lugar verdadeiramente privilegiado, quer pelo sossego quer pelas vistas sobre a longa e estreita costa que se prolonga a perder de vista.
Se o vento não soprar com muita força, o cordão de dunas abafa o barulho do mar e só lá do cimo, junto aos moinhos, é que nos apercebemos do seu balanço ritmado na linha branca de areia que segue para Norte e para Sul.
Escolhemos o Norte, numa manhã calma e de céu parado. À nossa esquerda, o mar; à direita, as antigas barraquinhas de guardar o sargaço, algumas habitações, tudo encarrapitado numa tira estreita de areia que o mar não há-de querer poupar durante muito mais tempo. Alguns barquitos de pesca artesanal dão um ar rústico à praia, mas a parte mais bonita – e selvagem – fica um pouco mais à frente.
À medida que caminhamos as dunas parecem crescer e encrespar-se numa barreira contra as ondas, que vão deixando alguns despojos marinhos aos seus pés. No cimo, nem casas nem moinhos, apenas a vegetação selvagem que antecede o pinhal sombrio de Ofir, que se alcança por um passadiço de madeira.
Mas quem prefere o sol continua pela areia, em direcção ao pontão que assinala a parte mais concorrida da pequena praia. Não faltam bons locais para arrefecer a pele em banhos salgados e frescos, partilhando com frequência a água com algas variadas, que depois se vêm estatelar na areia em desenhos abstractos – um autêntico spa, com a vantagem do ar livre.
O pior vem a seguir: junto à praia de Ofir, duas gigantescas torres de apartamentos saem das areias, incongruência tanto mais imperdoável que estamos na Área de Paisagem Protegida de Esposende e do Parque Natural do Litoral Norte.
O mar, domado aqui por dois pontões, é mais liso e procurado pelos banhistas do que mais adiante, onde cavalgam na espuma os rochedos escuros a que chamam Cavalos de Fão. Cavalos-marinhos, certamente, que podemos tentar alcançar se a maré estiver de feição, mas depois de duas horas com os pés na água, preferimos apanhar o passadiço de madeira que nos leva em direcção ao rio.
Entre mar e sol em Esposende
Viramos para Norte e entramos numa área de bosque dunar: arbustos baixos, plantas rasteiras e flores saem da areia, numa pequena amostra do que seria a zona no seu estado natural, sem interferências humanas.
Uma placa no início deste percurso, que nos conduz por um passadiço até ao ponto mais alto das dunas, dá-nos conta da riqueza faunística desta zona entre-mar-e-rio, cujas ilhotas e margens abrigam inúmeras espécies de aves, e mesmo algumas tímidas lontras (da espécie “invisível”, disse-nos por brincadeira um amigo de Esposende).
À medida que a vegetação baixa, maior é a visão sobre o mar, de um lado, e sobre o Rio Cávado, do outro. Serpenteamos sobre as tábuas de madeira do caminho até ao miradouro. Lá no cimo, espera-nos uma visão fantástica de cento e oitenta graus sobre a foz, o espelho parado do rio com os seus tufos de ilhotas, a linha de casas brancas de Esposende, o verde-escuro do pinhal de Ofir e, de novo, o mar, antecedido pela risca branca do areal.
Regressamos pelo mesmo caminho, mas desta vez mantemo-nos do lado oposto à praia, junto ao rio, penetrando no pinhal onde, muito menos tímidos que as lontras, alguns esquilos moreninhos saltam de árvore em árvore, eriçados, à nossa passagem. Chegamos a Fão percorrendo estradinhas labirínticas e sombrias, cujo arvoredo esconde moradias invejáveis. Adormecida, a povoação espalha-se dos dois lados da ponte sobre o Cávado, desenhada no atelier de Eiffel.
A zona antiga é um emaranhado de ruas estreitas refrescadas por sombras de muros altos e pela presença do rio. Algumas fachadas ainda conservam um certo charme antigo, mas falta-lhes a atenção que já foi dada à outra margem, em Esposende.
Esposende, ao perto e ao longe
À primeira vista, o casario certinho de Esposende parece demasiado previsível, alinhado com a margem do rio e como que aparado por cima, para não crescer. Mas umas voltas pelo interior mostram-nos que as ruas têm surpresas escondidas: arcos, pracetas agradáveis com esplanadas, ruas de peões, praças arborizadas. Reina o branco e os detalhes de granito, como é costume no Minho, mas a ditadura não é total, e a cor vai aparecendo em algumas fachadas.
Quase no fim da povoação, junto ao rio, fica o Forte de S. João Baptista e o pequeno farol que marca a entrada da barra. Há muito que o assoreamento progressivo do Cávado lhe retirou a importância que teve nos séculos XV e XVI, época em que Fão chegou a ter uma importante indústria naval e se podia navegar rio acima, até às imediações de Braga.
Neste momento, a foz é um local a não perder pela sua beleza, e poucos sítios oferecem um pôr-do-sol como este, com vistas sobre a curva muito redonda do rio em volta das areias de Ofir, onde as ondas se desfazem em espuma. O único rival sério será, talvez, a capela de S. Lourenço. Fica a cerca de três quilómetros daqui, no cimo de um monte e no local de um castro da Idade do Ferro que comprova a antiguidade do povoamento desta zona tão fértil.
No lugar da antiga necrópole fica agora a capela do santo que, dizem os entendidos, é muito bom para sarar as dores de dentes; mais justo seria que protegesse a visão, já que a panorâmica que se abrange daqui, num dia perfeitamente claro, vai da Póvoa até quase a Viana!
Lá em baixo, Esposende é agora um casario diminuto e branco junto ao rio, o mar é uma barra azulada e luminosa debruada pela sombra verde-escura dos pinhais. E entre o monte e o mar ficam os campos verdes, lisos e simétricos como uma folha de papel quadriculado.